terça-feira, 19 de agosto de 2008

Teogonia VI

Pequeno discurso sobre o nada.

Perguntado sobre a essência do nada, Amauta ficou emudecido. O nada não tem nexo, nem forma, nem causa. E o nada não é nada?

Será que o perguntador não sabe que todos somos compostos de infinitos nadas?

O Amauta abandona o silêncio. Silêncio também é nada.

Sapato velho num poste, ou uma janela suja e com vidros quebrados. Quando lá no alto de um morro, com pasto parco, um cupinzeiro sem uso, ou uma cabana já caindo aos pedaços, o que é, senão o nada?

É um cachecol sem pescoço, um canto vazio esperando a dona das formas sepultadas na saudade. Nada é abraço sem paixão.

Nada é abandono, que assoma o Amauta pouco a pouco, a cada olhar para o lado. Olhar que agora já não é mais o mesmo. Nada é tristeza que abranda o olhar, é a distância de palmos se fazer eras, fora de todo toque...

Nada é sentir um cheiro que não mais é seu, nem meu, e que nunca mais povoará os seus braços de aurora. Nada é abandono, que destrói e dói.

O nada é chuva sem fim num jardim de Açucena.