domingo, 17 de janeiro de 2010

Teogonia XXII

Da forma que a agonia tomou a saudade e ficou envergonhada quando viu que saudade que foi morar no longe querido era feita de tanto carinho.

Parecia frio, o peito vazio
procurando em algum lugar
paz qualquer que fosse.
De tudo que quero mais,
só me vale o que você faz.
Mas não encontro, não encontro.

Perderam-se ali? Nos jogos
que as luzes faziam
naquele ninho que você fez
que era o meu abraço?
Não encontro, não sei onde,
e não encontro!

Nem prestavas atenção
e eu já era também paisagem.
Esqueço do mundo,
me sorvi nele.
As palavras que não encontro:
me roubaram? Cuidado, cuidado.
Estão lá, nos olhos dela,
tal como a estrelas
que a luz mundo foram roubar.

Será que as encontro
vagando pela madrugada?
Em algum suspiro de namorada,
sonhando sob a luz da lua,
esperando o telefone tocar?
Essa mesma luz, roubada.
Do olhar da moça
que se aninha e poetinha diz
o que só cabe
ao seu nome:
fica, fica!
Ainda não encontro, não encontro.

De quantas agonias devem caber numa saudade?

Vasculho a mente, debulho palavras
que caem de suas bagas
pelo vento da madrugada
da moça enamorada
que eu queria pra mim.
E eu não encontro, nem assim.

É o fardo do lunfardo, Bernardo!
Êxtase, agonia, a dúvida
de que chegue logo
o outro dia.
Olhos em fornalha,
e de onde desce a lágrima
escura, quase inválida
de um Quixote vencido,
prostrado de saudade.

Não encontro, é verdade!
Das bagas
as palavras se esvaíram,
singrando por aí,
no vento úmido e morno
e azul marinho da madrugada.
Saudade não terá mais fim?
A reposta não encontro!

Espera, espera!
Umazinha ficou presa
no orvalho que do teu nome desce
– e digo pra ele rimar: fica!

Essa palavra tinha um gosto de sagrado.

O vento trouxe um cheiro de mirra,
quase o mesmo cheiro de flor
que desceu do céu,
quando era tanto o carinho
que fez do abraço ninho
e que se agarrou insistentemente
na saudade do poetinha.

É verdade, é verdade!
E foi quando soube
que aquele cheiro bom de flor
vinha do mesmo carinho
da moça do ninho.

Será que pude amar tanto só o que vem sua mão assim?