terça-feira, 28 de agosto de 2012

O piano: uma história mais ou menos inventada


Aconteceu há muitos anos, quando o mundo ainda se espantava com aquelas imagens. Elas se moviam! Aqueles irmãos, endiabrados e luminosos, deram ao mundo novos sentidos.

Vejam só que mágico: elas se moviam!

Naquela época, porém, esses novos sentidos do mundo não tinham cores nem som.

E justamente era esse o trabalho da vó. Ela dava som para o mundo novo. Som!

O filho mais novo dela contava que, quando menino, levava para ela as partituras, e ficava lá, quietinho, esperando a vó acabar. Sempre vou achar que essa era a melhor tarefa a ser dada para uma criança.

A vó sabia decompor o silêncio! Ainda hoje eu acho que o segredo de escrever é o mesmo que ela usava ao tocar o piano.

O tempo passou.

O piano da vó já não existia mais, ninguém sabia muito bem o seu paradeiro.

A netinha daquele menino que sentava ao lado do piano ouvia encantada aquelas histórias da vó. E ele inundava o mundo dela de imensidão, sonhos e curiosidades.

Dizem que foi por causa desses sonhos tão bonitos, mais puros que uma flor amarela e mais honrosos que qualquer medalha, que o piano não resistiu e quis voltar.

 A menina soube que ele estava lá, em algum lugar nas montanhas. E foi correndo atrás dele. Mal podia acreditar quando chegou; não foi um simples achado, era o embate de corações tremendamente delicados, afastados pelo tempo, que finalmente cumpriam seu destino de pertencerem um ao outro.

Até hoje o piano feito de sonhos está lá, na casa daquela menina, cheio de imenso, ressoando pela sala.

A menina não toca o piano; até mora longe dele. Mas quem a conhece consegue perceber que o piano mágico da vó deu a ela um dom.

Se vocês olharem lá no fundo dos olhos esverdeados da menina, podem ver num cantinho daquele brilho que quem não tem sonhos não tem nada nessa vida.